quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

Projecto de Dissertação de Mestrado: Algumas Conclusões


1. Assim culmimaram as nossas análises, a partir do Posfácio e de alguns pontos do Suplemento de Ukw, no que concerne à relação entre a Arte, a Técnica, a Verdade, a Beleza; a Arte, a obra de arte, o artista, a ciação e a comtemplação da obra de arte no seu nascer e no seu morrer, enveredando pelos caminhos propostos por Heidegger e por Van Gogh, limando algumas das arestas deixadas em bruto pel Estécica, abrindo espaçoos de problematização não absoluots, mas sempre em aberto, em virtude de permanecermos sempre conscientes de que cada interpretação não é senão um caminho entre múltiplos caminhos possíveis.

2. Tivemos a oportunidade de confrontar a interpretação heideggeriana da Arte, tomada no seu sentido originário, quer dizer, como “Grande Arte”, com a arte moderna dominada pela técnica implantada pela nossa civilização enraizada no mundo da indiferença, da realidade do projecto cibernético, da constelação “gestéllica”, da com-posição programada informaticamente do conjunto dos entes à escala planetária, dessa técnica que constitui uma autentica pro-vocação da Natureza, da Terra‑Mãe, outrora salvaguardada no tempo inaugural da harmonia universal de todas as coisas.

3. Verificámos que as obras de arte de hoje não têm mais as suas origens nas fronteiras de um mundo de povos e nações históricas. Pertencem à universalidade da civilizaçãoao mundial. A sua constituição e organização é projectada e governada pela técnica cientifica. É esta que decide acerca do modo e das possibilidades do estado de ser do homem neste Mundo historicamente determinado pela pura tecnicidade da relação entre as coisas: “ (...) Já só temos relações puramente técnicas. Já não é na Terra que o homwm hoje vive. (...) a técnica arranca o homem da Terra e desenraiza-o cada vez mais (...) Não é preciso nenhuma bomba atómica: o desenraizamento do homem já está aí. A engrenagem mais ampla da técnica moderna encerra a inter-relação do homem com o mundo e a terra desbravada e desamparada, uma vez que esta sociedade industrial existe no solo do estar-encerrado no âmbito dos seus próprios poderes (...) Já só um Deus nos pode ainda salvar. Como única possibilidade, resta-nos preparar pelo pensamento e epla poseia uma disposição para o aparecer desse Deus ou para a ausência do deus em declinio; preparar a possibilidade de que (...) pereçamos perante o Deus ausente”[1].

4. Conatatámos, ainda, evocando o próprio canto da Arte nos seus momentos de poesia pensante que “o mundo não pode ser aquilo que é tal como é só mediante o homem, mas também não pode sê-lo sem o homem” e que esta problemática se liga ao “Ser”, esa “palavra há muito tradicional, multívoca e hoje desgastada” que “precisa do homem para a sua manifestação, custódia e configuração”[2]. Por isso afigurou-se necessário voltar a trás em direcção ao principio (onde se encerra o que há de mais inquietante e de mais misterioso) que nos havia indicado a deusa Atena, quer dizer, ao parentesco inicialmente existente entre jusiz e tecnh ; deixarmo-nos conduzir até àquilo que tendo sido nomeado no início do pensar ocidental foi necessariamente deixado impensado e se tem ocultado permanentemente ao nosso pensar, para que obra de arte possa mostrar de novo o que não está directamente à disposição do homem, aquilo que amiúde se encobre e que urge ser desocultado. Isto corresponde à escuta intima do apelo do Ser e simultaneamente ao doar da resposta adequada a que tal apelo nos conduz.

5. O caminho a percorrer foi-nos sugerido e indicado pela obra de arte, a única capaz de mostrar, na sua autenticidade radical, aquilo que não está à disposição do homem, aquilo que se encobre e que apela para outra direccionação da escuta e do olhar. Só assim poderemos conceder à Arte, enquanto obra, o poder de dizer o que ainda não é sabido, de mostrar o que ainda não é mostrado, de fazer ver o que ainda não é visto, de molde a que se possa acordar, no homem, o que não se deixa planear, nem calcular, nem alienar por meios estranhos à semelhança daqueles impostos pelo mundo da cibernética, pelo imperialismo da ciência-técnica moderna que esgotam a entidade própria do ente, que não deixam ser o ente como algo que é e que revela esse fundo fundante que designamos numa única palavra: Sein.

6. A Arte é pois epifania, mostração primordial do Ser na sua verdade, ao fazer aparecer o que ainda não é como é. O exercício de ser da Arte não é senão o des-cobrir en-cobridor que põe a coberto a essência. Esta tese indica-nos que a via de uma ontologia da Arte recusa-se a seguir os passos da teoria estética e que a atitude do pensar jamais se pode conceber como a necessidade antropológica de respostas cientificamente demonstradas e só em aparência cabais.

7. Procurou-se tão só dar voz à interrogação espectante e serena do jogador que se sabe em jogo, mesmo ainda antes de conhecer as cartas que lhe toca jogar. Eis o grande apelo e interpelação da obra de arte autêntica manifestamente explicitado não apenas pela pintura, cujo representante supremo é para Heidegger Van Gogh ‑ aquele que pinta as cores da Terra sem no entanto fazer da sua tela o fundo a partir do qual se desenvolve o talento ou o génio do artista, mas que ao invés faz da tela o topoz originário onde o Ser se mostra na sua verdade e a obra que por si mesma fala ‑ mas também, e quiçá sobretudo, pela poesia (Dichtung), onde repousa , em última instância a essencialidade da Arte.
Reflectimos, pois, “sobre o Heidegger, pensador da terra, enqunato pensador do tempo como desdobramento dos entes, pensador do Ser como a Europa nunca o soube, nem os greghos (...), pensador do futuro, do que vem, nos abre ao habitar como ortais, como filhos da Terra, a grande doadora, nossa destinadora. Assim (lemos) Heidegger, o Geo-Logos, o pensador da Terra”.[3]


Notas:
[1] M. Heidegger, “Já só um Deus nos pode salvar”, in Filosofia, Vol. III, Nº 1/2, Outono’89, p. 121 - 122.
[2] Idem, p. 122.
[3] Fernando Belo, Heidegger. Pensador da Terra, p. 56.

3 comentários:

Isabel Rosete disse...

Amo a Arte,
A mais nobre invenção
Do espírito humano.

A si tudo chama,
Clama,
Canta,
Eterniza,
Epifaniza…

Na mostração de um tempo outro,
O artista dá-se,
Na sua identidade
Iluminatória.

Um ente hábil,
Que tudo vê,
Acolhe,
Recolhe,
Escuta…
Até ao limiar dos ultra-sons.

O artista,
Permanece,
Aí,
Intacto,
No espaço universal,
Junto às orelhas da Terra,
Em constante grito de alerta.

Move-se,
Contra as degeneradas
Investidas tecnológicas.
Remove-se,
Contra os desequilíbrios
Eco-sistemáticos…

Protesta,
Contra as artimanhas
Do progresso,
Que sempre avança,
Sem auto-crítica
Sem racionalidade…
Isabel Rosete

Anónimo disse...

Os seus textos são excelentes e muito prazeirosos. É uma honra para mim poder participar dos seus pensamentos.

Grande abraço.

Isabel Rosete disse...

Muitíssimo obrigada.
Um abraço para si também.